“Se, porém, algum de
vós necessita de sabedoria, peça-a a Deus” - Tiago 1.5a
Viver é topar com desafios todos os dias. Mas será
que estamos preparados para enfrentar essa colisão, suas sequelas, e sairmos
ilesos, sem nenhum arranhão? Se essa pedra de tropeço existe no meio do nosso
caminho, a quem recorrermos para conseguirmos esmagá-la? Que ferramentas usaremos
para isso, e como as utilizaremos?
E agora, José? – como diz o poeta.
Se não estamos livres dessas aflições, para
podermos lidar com elas, uma dessas ferramentas que temos que utilizar é a
sabedoria. Mas se, em geral, sabedoria significa conhecer o melhor fim e os
melhores meios de atingir esse fim [1], dentro dos princípios cristãos, de onde
poderá vir essa sabedoria? Como podemos obtê-la ou como devemos pedir essa
sabedoria, já que ela envolve a visão das coisas sob a perspectiva de Deus?
Vejamos alguns pontos que podemos depreender da
epístola de Tiago 1.5-8 que podem muito bem ajudar-nos diante dos desafios, provações
ou aflições em nosso dia a dia.
1. Se necessitamos de sabedoria, devemos pedir
a Deus, e os seus resultados só vêm com a prática de uma vida cristã.
“Se, porém, algum de vós necessita de
sabedoria, peça-a a Deus, que a todos dá liberalmente e nada lhes impropera; e
ser-lhe-á concedida.”, diz Tiago 1.5.
A epístola de Tiago trata dessa prática de vida
cristã. Ou melhor, Tiago destaca a vida cristã prática. Isso é notável pelos seus
ensinamentos morais e éticos de relevância para a Igreja.
Tiago trabalha com temas do nosso dia a dia, como as
provações e a fé, a obediência e a religião prática, a realidade da fé, o
controle da língua, além de sérias advertências contra o mundanismo,
advertência aos ricos e de exortações à vinda do Senhor. Lidar em meio a tudo
isso requer de nós sabedoria.
Tiago escreveu para a Igreja, não para uma Igreja
específica, mas para os cristãos em geral. Seus escritos valem para todos nós
ainda hoje.
O texto do capítulo 1, versos 5 a 8 é uma sequência
inserida no contexto de provações e fé, que se inicia nos versos 2 a 4. O conjunto
do contexto desses versículos de 2 a 8 é como se fosse um lide – ou seja, um
resumo de tudo o que o autor irá desenvolver daí para frente.
Vejamos os versos 2-4:
“Meus irmãos, tende por motivo de toda
alegria o passardes por várias provações, sabendo que a provação da vossa fé,
uma vez confirmada, produz perseverança. Ora, a perseverança deve ter ação
completa, para que sejais perfeitos e íntegros, em nada deficientes.”
Provações são motivos de alegria, não de tristeza. Paradoxo? Não para os verdadeiros
cristãos, que entendem muito bem essa linguagem. Deus não nos prova à toa, por
nada, ou para destruir-nos. Ao contrário, para tudo existe um propósito nos
planos de Deus que quer nos ver com uma vida espiritual saudável, tendo em
vista o nosso constante aperfeiçoamento, e prontos para estarmos sempre ao lado
dEle, agora, e eternamente.
As tentações ou provações servem como um teste de fortalecimento
da nossa fé. Se passarmos neste teste, isso produz em nós a perseverança para
que sejamos perfeitos e íntegros. Entretanto, sabemos que isso não é nada fácil.
Diante das provações deste mundo, muitas vezes, é difícil sairmos ilesos.
Muitas vezes nossas próprias forças não dão conta. Essas provações nos deixam
perplexos, indecisos, impotentes. Diante desta situação, precisamos desta sabedoria
para lidar com tantos desafios.
Como é certo que as provações existem, para
podermos suportá-las, devemos pedir sabedoria somente a Deus, porque Deus é a
fonte de toda sabedoria, não os homens. Somente da parte de Deus, o SENHOR dos
Exércitos, é que vem o nosso socorro, já que a sabedoria dos homens não reconhece
a sabedoria de Deus, porque atua dependendo das nossas mesquinharias e ocasiões,
parcialmente, e no âmbito das nossas limitações ou finitude.
Será que as guerras, e tantas outras desavenças, a
fome mundial, a devastação do meio ambiente, os assassinatos, a corrupção –
dentre tantos outros desequilíbrios –, são exemplos de sabedoria? Onde estão os
sábios deste mundo? (cf. 1Coríntios 1.20,21).
O verso 5b diz: “e
ser-lhe-á concedida”. Isso significa que a promessa de concessão dessa
sabedoria divina é uma certeza para quem pede, confia em Deus e cumpre a Sua
vontade.
Daí a Palavra de Deus, em Provérbios 2.1-22,
destacar os resultados para quem aceita a sabedoria: o conhecimento de Deus e
as bênçãos da vida. “Então, entenderás o
temor do SENHOR e acharás o conhecimento de Deus” (v. 5; cf. v. 9 e 21). A
Bíblia de Estudo de Genebra (1999, p. 728) também diz que esses dois aspectos da sabedoria são
vistos claramente: o dom divino e a tarefa humana. [2]
Os versículos 3 a 6 do capítulo 2 de Provérbios
confirmam isso:
“E, se clamares por inteligência, e por
entendimento alçares a voz, se buscares a sabedoria como a prata e como a
tesouros escondidos a procurares, então, entenderás o temor do SENHOR e acharás
o conhecimento de Deus. Porque o SENHOR dá a sabedoria, e da sua boca vem a
Inteligência e o entendimento.”
De boa vontade Deus dá sabedoria a todos nós. Essa
sabedoria nos é concedida sem censura, e livremente, sem nenhuma acepção,
porque Deus é infinitamente sábio, e, nós, totalmente dependentes dEle, para
que não gloriemos na nossa sabedoria, posto que conhecer a Deus constitui a
glória do homem (Jeremias 9.23,24).
Todos conhecemos a história do rei Salomão. Até os
incrédulos. Em 1Reis 3.7-14 está escrito que Salomão, um jovem rei que assumiu
o posto depois da morte de seu pai Davi, estava diante de um grande desafio,
que era governar o povo de Deus – uma grande nação que nem se podia contar.
Salomão pediu a Deus um coração compreensivo para poder julgar esse povo, para
prudentemente discernir entre o bem e o mal (v. 8,9).
Deus agradou-Se de Salomão porque ele não pediu nem
riquezas nem vida longa nem a morte de seus inimigos, mas, sim, entendimento
para discernir o que é justo. Veja aí o conceito de sabedoria. Assim, o SENHOR
deu a Salomão um coração sábio e inteligente, e até o que ele não pediu, tanto
riquezas como glória.
Porém, o SENHOR fez uma ressalva a Salomão:
“Se andares nos meus caminhos e guardares os
meus estatutos e os meus mandamentos, como andou Davi, teu pai, prolongarei os
teus dias” (v. 14).
Como é que nos portamos diante das nossas
dificuldades, tribulações ou provações? Queremos resolver tudo do nosso jeito
ou paramos um pouco e respiramos, primeiramente, colocando tudo diante de Deus?
Como é que nos portamos diante da nossa família, do
nosso cônjuge e nossos filhos, no nosso ambiente de trabalho ou mesmo na
Igreja? Será que pedimos a Deus sabedoria para resolver as situações difíceis
ou agimos por conta própria? Será que sabemos pedir ou não recebemos porque não
sabemos pedir?
Salomão soube pedir, e nós sabemos os resultados desse
seu pedido. Como é que estamos pedindo a Deus? Como é que estamos orando, como
aquele fariseu ou como o publicano citados em Lucas 18.9-14?
São muitos os exemplos bíblicos que tratam da
sabedoria. Podemos aprender muito com todos eles. Já falamos de Salomão. E de
Jesus Cristo? Quem já ouviu falar dEle? Você já ouviu falar ou já teve uma
experiência pessoal com Ele? Que ninguém se constranja, mas pense nisso.
Outro exemplo é o de Tiago, que pode muito bem ser
o nosso. Tiago era irmão de Jesus, mas só reconheceu a Cristo como seu Salvador
depois da ressurreição. Daí para frente Tiago tornou-se um dos pilares da
Igreja, juntamente com Pedro e João. [3] Tiago assumiu posição de autoridade como líder
da Igreja, além de presidir o concílio de Jerusalém (Atos 15). Homem de
coragem, e piedoso, de singular devoção à oração, foi martirizado em 62 d.C.
Bateram nele com uma clava até a morte depois de ter sido atirado do parapeito
do templo.
Tantos
outros tiveram tão belos exemplos de vida porque optaram pela sabedoria lá do
alto com vistas à defesa da sua fé, mesmo em meio a tantas aflições. Jesus foi
tentado por Satanás logo no início de Seu ministério terrestre. Foi perseguido
pelos fariseus até a morte na cruz. Mas agiu sempre com humildade, que é uma
das características da sabedoria.
Assegurando-nos de que no mundo teremos aflição,
mas que Ele mesmo venceu o mundo, Jesus foi humilhado a ponto de tornar-Se
homem, habitar entre nós, e morrer por nós, pela nossa salvação, para, depois,
ressuscitar, seguindo os propósitos de Seu Pai. Jesus é fruto da sabedoria de
Deus.
Será que temos fé para acreditar em tudo isso? Para
seguir tais exemplos? Para suportar provações semelhantes? Você crê que Jesus é
seu único e suficiente salvador, e que toda sabedoria vem somente de Deus por
meio desse mesmo Jesus? Pense nisso mais uma vez.
2. Se necessitamos de sabedoria, devemos pedir
com fé, em nada duvidando – diz Tiago 1.6a.
Se Deus é a fonte de toda sabedoria, e se sempre
necessitamos de sabedoria para vencermos as aflições deste mundo conturbado e
enganador, e se devemos pedir essa sabedoria a Deus diante de tantos desafios,
isso deve ser feito com fé, sem duvidar. Devemos pedir com toda sinceridade. De
coração aberto, além de uma vida piedosa, um espírito manso e humilde, pois se
a arrogância e a insensatez andam juntos, assim também acontece com a humildade
e a sabedoria.
Se não agirmos com fé, mesmo em qualquer área de
nossa vida, até secularmente, nada conseguiremos. Se pedirmos com fé, Deus nos
concederá não apenas sabedoria, mas até mesmo outras coisas.
Como vem agindo essa fé em nós? Como temos dado
razão dela diante dos outros? Diante dos incrédulos? Diante das nossas
provações, desafios ou aflições? A fé também é dom de Deus. Temos pedido essa fé
a Deus? Quais as obras dessa nossa fé? A sabedoria também é um produto da nossa
fé. Se fé sem obras não vale nada, aqui, a sabedoria é uma das obras da nossa
fé, lembrando que, sem fé, é impossível agradar a Deus.
3. Se necessitamos de sabedoria, devemos pedir
sem vacilar, sem desviar o foco, com perseverança.
Essa perseverança deve ter uma ação completa, para
que sejamos perfeitos e íntegros, em nada deficientes diante da provação e
confirmação da nossa fé (v. 3,4). Diferentemente de quem tem sua mente
dividida, e é instável em tudo o que faz. Este não receberá coisa alguma do
Senhor, pois é semelhante às ondas que são levadas e agitadas pelo vento. Fazem
muito barulho, e espatifam-se nas pedras
e ribanceiras a beira-mar.
“pois o que duvida é semelhante à onda do
mar, impelida e agitada pelo vento. Não suponha esse homem que alcançará do
Senhor alguma coisa; homem de ânimo dobre, inconstante em todos os seus
caminhos.” (Tiago 6b-8)
Será que estamos levando a sério as nossas orações?
Ou será que somos como essas ondas do mar, que fazem muito barulho por nada?
Até que ponto vai a nossa hipocrisia diante de Deus, ou a nossa humildade e sinceridade?
A sabedoria somente é obtida por uma completa
dependência de Deus, como já foi dito. Toda sabedoria vem do alto. As obras dos
homens mostram que não somos tão sábios e inteligentes assim. Todos
necessitamos da sabedoria de Deus.
Tiago 3.13-18 faz um desafio a todos nós. O autor pergunta
quem dentre os homens é sábio e inteligente a ponto de demonstrar por seu bom
procedimento as suas obras praticadas com a humildade que provém da sabedoria.
Prosseguindo, Tiago mostra-nos dois tipos diferentes
de sabedoria.
A sabedoria dos homens:
“Se, pelo contrário, tendes em vosso coração
inveja amargurada e sentimento faccioso, nem vos glorieis disso, nem mintais
contra a verdade. Esta não é a sabedoria que desce lá do alto; antes, é
terrena, animal e demoníaca. Pois, onde há inveja e sentimento faccioso, aí há
confusão e toda espécie de coisas ruins.” (v. 14-16)
A sabedoria de Deus:
“A sabedoria, porém, lá do alto é,
primeiramente, pura; depois, pacífica, indulgente, tratável, plena de
misericórdia e de bons frutos, imparcial, sem fingimento. Ora, é em paz que se
semeia o fruto da justiça, para os que promovem a paz.” (v. 17,18)
A sabedoria de Deus gera paz, e a paz gera paz,
obviamente. Não gera confusão nem outras coisas ruins.
O Salmo 111.10 diz que o temor do SENHOR é o
princípio da sabedoria. A excelência da sabedoria é fazer a vontade de Deus. Para
isso não devemos vacilar nem envolver-nos em incredulidades, em nossos próprios
métodos ou depender de outrem, a não ser de Deus.
Provações, fé, perseverança e sabedoria são a chave
para o nosso crescimento espiritual. São conceitos que atuam em conjunto, e
exigem uma atitude de nossa parte. Como temos agido em nosso dia a dia diante
de tantos desafios?
Todo esse contexto aqui tratado envolve momentos de
oração. Mas de oração sincera, não de um tipo de jogo com Deus. Se realmente
quisermos obter respostas às nossas orações, uma das condições é termos ânimo
singelo, e confiar em Deus apenas, sem desviar do objetivo. Sendo constantes, e
perseverantes, mesmo diante das nossas aflições. E não agirmos como as ondas do
mar que são impelidas e agitadas por quaisquer ventos, e morrem na praia.
Não adianta reinventarmos a roda. Em meio às nossas
provações e desafios a sabedoria tem função muito importante, não somente para
nossa vida diária, mas até para o nosso relacionamento interpessoal. Experimente,
faça como Salomão, peça sabedoria a Deus, mas peça com fé e perseverança, sem
titubear; e mire-se em Cristo, a essência da sabedoria.
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Notas e Referências
[1] McNab, Andrew. A Epístola Geral de Tiago. In: O
Novo Comentário da Bíblia. v. II. São Paulo: Vida Nova, 1990. Reimpressão. p. 1389
[2] Bíblia de Estudo de Genebra. São Paulo e Barueri:
Cultura Cristã e Sociedade Bíblica do Brasil, 1999. p. 728, 1485-1486
[3] João 7.5; Mateus 13.55; 1Coríntios 15.7; Gálatas
1.19; 2.9