quarta-feira, 28 de março de 2012

JUDAS ISCARIOTES - O Apóstolo Apóstata?



Além de ser uma das figuras mais controversas da Bíblia, Judas Iscariotes ainda é lembrado pela maioria das pessoas como um traidor; como o discípulo que traiu Jesus aos romanos por 30 moedas de prata – isso equivalia ao preço de um escravo daquela época. Assim Judas é nomeado pelos apóstolos após o seu tão degenerado gesto, e a expressão “aquele que traiu Jesus” consta nos quatro evangelhos canônicos [1], compondo um dos itens de toda a história do povo cristão.

Além de traidor [2],Judas também é designado com outros adjetivos nada agradáveis [3] por causa de sua conduta, ainda que

Afirmam as interpretações convencionais que Judas Iscariotes seria um dos mais precoces apóstolos, bem como um dos que detinham maior nível cultural, sendo por este motivo escolhido para ser o Tesoureiro do grupo. Alguns se baseiam neste fato para argumentar que ele sempre cultivou a ganância, sendo por isso escolhido para realizar a terrível traição em troca de um valor que correspondia ao preço de um escravo [4].


Este perfil de Judas é tão marcante que, até os dias de hoje, cultiva-se no folclore brasileiro a tradicional malhação de Judas no sábado de aleluia, quando um boneco confeccionado com palha é enforcado em postes, árvores ou em qualquer outro objeto e, depois de derrubado a tiros, é pisoteado, cuspido, ultrajado e estraçalhado ou queimado pelo povo.

Violências à parte, muitas vezes, nesta ocasião, esse boneco representa alguém da própria comunidade, principalmente autoridades políticas ou outras pessoas não gratas àquele meio. É uma espécie de homenagem ao contrário, ou seja, pelos desserviços ou males prestados por parte destes “homenageados”.

No mundo artístico, talvez a descrição mais conhecida de Judas seja o afresco de Giotto di Bondone (1267-1337) intitulado O Beijo de Judas, que se encontra numa capela na cidade de Pádua, Itália. Outra representação conhecida pode ser encontrada em A Última Ceia, de Leonardo da Vinci, em que o artista mostra Judas um pouco menor e mais escuro do que os outros discípulos, e ele parece estar segurando um saco que poderia conter o dinheiro do suborno [5].

Muito se tem criticado, escrito e falado sobre a personalidade e o caráter de Judas com o intuito de poder entender a sua mente e explicar o que o levou a praticar o tão fatídico ato. No entanto, muitos também defendem que Judas não deve ser responsabilizado por tudo isso que se fala dele. Vários estudiosos têm sugerido que ele era simplesmente o negociador em uma rendição secreta previamente combinada, e que seu retrato, mais que um traidor, é uma distorção histórica [6].

Outros, ainda tentando defendê-lo, dizem que Judas não merece tanta maldição, posto que mesmo ele tendo essa fama de ladrão, nunca havia deixado de assistir aos carentes.Veja o disparate:

Judas Iscariotes – “aquele que O traiu”, é a maldição que carrega sem merecer. Nacionalista, treinado em guerrilhas urbanas, era o mais jovem e mais culto do Colégio de Apóstolos. Articulador político e tesoureiro do grupo, tinha fama de ladrão, mas nunca deixou faltar óbulos para os pobres, órfãos e viúvas [7].


Tais comentaristas esquecem-se de que essas suas posturas só confirmam o caráter deformado de Judas, acentuando ainda mais os seus atos estranhos. Isso não justifica a sua fama, e nos faz lembrar ditos infames como “rouba, mas faz” ou “estupra, mas não mata”, tão bem conhecidos em nosso meio, que, se não fossem tão reais e grotescos, seriam piadas – de mau gosto, é claro.

Além de outros pontos de vista sobre esse mesmo tema destacados no livro A Conspiração da Páscoa, por Hugh J. Schonfield, e também no polêmico filme A Última Tentação de Cristo, essas ideias voltaram à tona novamente com a descoberta de uma cópia antiga de um evangelho de Judas que se considerava perdido, mas que ainda não foi endossado cientificamente. Considerado apócrifo pela Igreja Cristã, dizem que este dito evangelho seria um escrito gnóstico do século II [8]. A maioria dos estudiosos duvida de que esse evangelho de Judas seja uma fonte confiável de informação.

Por sua vez, os evangelhos de Mateus, Marcos, Lucas e João são os quatro e únicos aceitos pelos cristãos. Por isso é que não se deve esquecer de que as ideias acima expostas não condizem com a Bíblia, que é a regra de fé e prática dos cristãos. Nem mesmo por ela são citadas, defendidas ou relacionadas, o que se leva a crer que não passam de documentos apócrifos ou de meras especulações caracterizadas por pessoas cujos interesses escusos desviam o foco daquilo que histórica e tradicionalmente vem sendo ratificado.

Isso exige de nós uma séria reflexão, pesquisa e um direcionamento com maior acuidade e tratamento com melhor cuidado a respeito daquilo que a Bíblia ensina através dos tempos – se é que temos tal sensibilidade. Assim, dificilmente cairemos em ciladas parecidas com estas: São más as traduções e tendenciosas as referências das narrativas sinóticas ao caráter deste discípulo estigmatizado como “ladrão”, “traidor”, “filho da perdição”. Foi o bode expiatório dos doze e fácil alvo dos recalques do moderno cristianismo [9].

Segundo a Bíblia, desde os mais remotos tempos já se prenunciavam tais fatos sobre o papel de Judas, tendo em vista a missão do Messias [10]. Fatos estes que foram determinados por Deus, com sérias consequências àqueles que os praticassem, diferentemente do que criticam alguns comentaristas que, ao desqualificarem as traduções e as referências das narrativas sinóticas quanto ao caráter de Judas, confundem as pessoas, principalmente num mundo onde hoje em dia tudo é relativo.

Em Mateus 26.14-16, Judas traiu Jesus por ganância com dinheiro de suborno, acertando com os principais sacerdotes o pacto da traição:

Então, um dos doze, chamado Judas Iscariotes, indo ter com os principais sacerdotes, propôs: Que me queres dar, e eu vo-lo entregarei? E pagaram-lhe trinta moedas de prata. E, desse momento em diante, buscava ele uma boa ocasião para o entregar.


Em Lucas 22.3-6 e João 13.27 diz que Satanás entrou em Judas, tomando o controle dele, conforme esclarece João 13.2. Já em João 13.27a diz: “E, após o bocado, imediatamente, entrou nele Satanás” (Ver também Lucas 22.3-6). E João 13.2 afirma: “Durante a ceia, tendo já o diabo posto no coração de Judas Iscariotes, filho de Simão, que traísse a Jesus”.

Sobre esse pacto da traição, a Bíblia de Estudo de Genebra (1999, p. 1218), comentando Lucas 22.3-6, afirma: “Satanás tomou o controle de Judas (Jo 13.2); foi Judas quem procurou os principais sacerdotes, e não eles quem procuraram Judas. Os “capitães” da guarda do templo eram, na sua maioria, levitas” [11].

Mesmo assim, alguns estudiosos bíblicos apresentam outra versão. Eles dizem que Judas sonhava com Jesus na liderança de uma revolta contra os romanos, assentando-Se no trono de Davi, e, com ele, o próprio Judas, cuidando das finanças. Frustrado com seu plano mirabolante, confabula a traição, entregando Jesus a Seus inimigos por meio da senha de um beijo [12], que é citado em Mateus 26.14-16,47-50, e que ainda hoje faz sentido entre as pessoas quando alguém, fingindo, usa de falsidade para com outrem, beijando-lhe, ou tratando-o de maneira normal, mas que, na realidade, é somente à base das aparências, da mentira, da hipocrisia e das simulações, segundo suas próprias circunstâncias. É o tão famigerado “beijo de Judas”.

Quanto ao fato do sonho não consumado de Judas, há contestações, e foge da verdade bíblica, mas quanto à questão do beijo, a Bíblia traz tudo nos seus mínimos detalhes, assim como as consequências desta traição [13].

Segundo R. P. Martin, com este beijo, o sinal identificador foi o último toque de ironia em que o papel do traidor se completara, já que se tornara cativo de Satanás, conforme João 13.27-30. Ainda segundo a Bíblia de Estudo de Genebra, a recusa de Judas em responder ao apelo de Jesus abriu o seu coração para o controle de Satanás. “Judas era ainda um agente responsável, mas submetera-se ao domínio do mal”, ressalta, lembrando João 8.34, posto que todo o que comete pecado é escravo do pecado [14].

Os comentaristas também afirmam que Jesus tinha plena consciência da Sua traição – João 13.27b, que Ele continua no controle dos acontecimentos, e que, no desenrolar de todos esses eventos, não fazia mais nenhum esforço para refrear Judas no seu propósito fatal. Jesus falou sobre Sua traição várias vezes, e, apesar de nunca ter mencionado Judas pelo nome, Ele o identificava indiretamente [15].

Judas era um nome comum na antiga Palestina. Os escritores dos evangelhos normalmente acrescentaram o sobrenome Iscariotes para deixar claro sobre quem eles estavam falando. Em João 6.70,71 e 13.2,26 Judas Iscariotes é filho de Simão. Ele era o único seguidor de Jesus não proveniente da Galileia, e, sim, de Quiriote, na região da Judeia.

Os pesquisadores dizem que a origem da palavra Iscariotes é incerta, mas o termo é melhor explicado do hebraico de onde “iscariotes” significa “homem de Queriote”, localizada em Moabe – Jeremias 48.24,41; Amós 2.2. Contudo, existe ainda outra identidade possível, a saber, “Quiriote-Hezrom” – Josué 15.25, que fica a dezenove quilômetros ao sul de Hebrom. Ainda segundo esses mesmos historiadores, essa explicação geográfica de “Iscariotes” é preferível ao ponto de vista que traça essa palavra ao termo aramaicizado sikarios e latino sicarius, que signifca “um assassino” – cf. Atos 21.38 [16].

Essas mesmas fontes afirmam que os sicarii eram um grupo de assassinos rebeldes que estava resistindo à ocupação romana do país. Assim, Judas poderia ter sido originalmente um membro deste grupo. Parece que o prisioneiro libertado Barrabás também poderia ter pertencido a este grupo.

Mas paira no ar, ou melhor, fica atravessada na garganta uma pergunta que não se cala: “Pode Satanás possuir um filho de Deus? E o que dizer de que todos os discípulos estavam limpos, menos Judas?” [17] A resposta deve ser, então, porque Judas não era um cristão verdadeiro. Ou melhor, nunca foi.

Martin (1990, p. 884) afirma que Judas nunca pertenceu a Cristo. Diz ainda que Judas caiu do apostolado, mas nunca teve uma relação genuína com Jesus. Por isso é que ele sempre permaneceu como “o filho da perdição”, que se perdeu por nunca ter sido salvo. “Ele sai do relato dos evangelhos como ‘um homem condenado e perdido’ porque assim preferiu, e Deus o confirmou nessa espantosa escolha” [18].

Será? Há controvérsias açuladas pelos liberais de plantão – como sempre, conforme Mariem (p. 149): “Judas foi um apóstolo que pela sua brilhante inteligência bem poderia ter sido o primaz no Colégio de Apóstolos. Creio ter sido ele perdoado por Jesus, que o chamou de amigo ao receber o beijo da traição.” [19]

No entanto, a maioria dos teólogos acredita que Judas agiu de livre vontade e deve ser punido por isso, contrariando os que acreditam ter sido Judas perdoado por Jesus, posto que Ele até o chamou de amigo ao receber o beijo da traição. Até o escritor medieval Dante Alighieri aparentemente concordou, porque em seu Inferno condenou Judas por toda a eternidade nos dentes de Satanás.

De qualquer modo, a respeito destes fatos tudo já estava predito. E contra fatos não existem argumentos, pois a Bíblia, no Evangelho de Mateus diz: “O Filho do Homem vai, como está escrito a seu respeito, mas ai daquele por intermédio de quem o Filho do Homem está sendo traído! Melhor lhe fora não haver nascido! Então, Judas, que o traía, perguntou: Acaso, sou eu, Mestre? Respondeu-lhe Jesus: Tu o disseste” [20].

Ainda a esse respeito a Bíblia de Estudo de Genebra ressalta que a morte expiatória de Jesus não resultou de um mero artifício das autoridades mal orientadas. Afirma que o evento e suas circunstâncias, inclusive a traição por um amigo – Salmo 41.9; 55.12-14, tinham sido determinados por Deus desde antes de o mundo ser formado, e que, não obstante, os que levaram a efeito a morte de Jesus permanecem responsáveis por suas próprias ações – Atos 1.16,25; 2.23. Com base em Atos 1.25, R. P. Martin diz que o apóstolo se transformou num apóstata [21].

Daí, o seu fim trágico [22]. A Bíblia diz que Judas, “tocado de remorso”, atirou para o santuário as moedas de prata e, retirando-se, foi enforcar-se. Diferentemente do que dizem alguns teólogos – que até questionam o suicídio de Judas, e até afirmam que tenha sido salvo, assim como também alguns gnósticos que acreditam que ele simplesmente se retirou para o deserto com o objetivo de meditar – cf. Mateus 26.24; Lucas 22.3; Atos 1.16-21,25, outros dão conta de que este remorso de Judas não é a mesma coisa que arrependimento.

Os especialistas ensinam que o arrependimento não consiste apenas em mostrar tristeza pelo pecado, porém, em uma decisiva mudança, uma volta do pecado para uma vida de obediência. Não significa autopunição ou remorso. Judas encheu-se de tristeza e de angústia – Mateus 27.3, mas não se arrependeu.

Assim, cumprem-se as Escrituras. Não do jeito que muitos de nós gostaríamos que se cumprissem, mas segundo os planos de um Soberano Deus, que vêm sendo traçados desde antes da fundação do mundo. E Judas também faz parte desse plano, mesmo com um fim tão trágico para nossa ótica. Judas faz parte desse plano, não do nosso jeito, mas segundo a ótica de Deus; como Ele quer que seja.

Por isso é que, nos dizeres de Martin (1990, p. 884), ainda mais aterrorizante que os cruentes detalhes bíblicos sobre Judas é o claro e franco veredito de Atos 1.25, quando os apóstolos se reúnem para escolher quem ficará no lugar de Judas: “Para preencher a vaga neste ministério e apostolado, do qual Judas se desviou, indo para o seu próprio lugar” (cf. Atos 1.16,17).

Esta passagem bíblica, e tantas outras que tratam do papel de Judas, não deixam dúvidas quanto ao fim daquele que é conhecido como “ladrão”, “traidor” e “filho da perdição” – e tudo aconteceu, assim como tudo deve acontecer, para a glória de Deus!

Que todos esses eventos sirvam-nos de reflexão nestes tempos de tanta incerteza,hipocrisia,ladroeira e traição, inclusive no meio daqueles que se dizem cristãos.Que cada um de nós vigie, cuidando para não cairmos em tentações. E, na medida do possível, diminuirmos esse "judas" que existe dentro de nós, agindo na contramão dos propósitos de Deus.

Que cuidemos cada dia mais, fugindo até daquilo que tem a aparência do mal, não entristecendo o SENHOR nosso Deus na pessoa dAquele que tanto Se humilhou e sofreu para resgatar os verdadeiros filhos de Deus.Creia nEle somente!


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NOTAS

1 Mateus 10.4; Marcos 3.19; Lucas 6.16; João 12.4
2 João 13.2
3 "avarento" - Mateus 26.14,15; "hipócrita", ladrão" - João 12.6; "filho da perdição" - João 17.12b
4 SANTANA, Ana Lúcia. Judas Iscariotes. Disponível em: www.infoescola.com.br Acesso em 25-08-2011
5 Judas Iscariotes. Disponível em www.gospel-mysteries.net Acesso em 25-08-2011
6 idem
7 MARIEM, Nehemias. Jesus à Luz da Nova Era. p. 76
8 Judas Iscariotes. Disponível em www.gospel-mysteries.net Acesso em 25-08-2011
SANTANA, Ana Lúcia. Judas Iscariotes. Disponível em www.infoescola.com.br Acesso em 25-08-2011
9 MARIEM, Nehemias, op. cit., p. 149
10 Jeremias 19.1-13; Mateus 27.1-10; Zacarias 11.12,13; Mateus 26.14-16; cf. Êxodo 21.32
11 Bíblia de Estudo de Genebra. São Paulo e Barueri: Cultura Cristã e sociedade Bíblica do Brasil, 1999. notas. p. 1218
12 MARIEM, Nehemias. op. cit., p. 76
SANTANA, Ana Lúcia, op. cit.
13 Mateus 26.47-56; 27.1-61
14 MARTIN, R. P. Judas Iscariotes. In: O Novo Dicionário da Bíblia. v. 2. J. D. Douglas (org.). São Paulo: Vida Nova, 1962, 1990. p. 884. Reimpressão
Bíblia de Estudo de Genebra, op. cit., p. 1254
15 idem
Judas Iscariotes. Disponível em www.gospel-mysteries.net Acesso em 25-=08-2011
16 idem
O Novo Dicionário da Bíblia, 1962, p. 883
17 João 13.10,11
RAIMUNDO, Francisco César. Judas Iscariotes Perdeu a Salvação? Disponível em www.revistacrista.org Acesso em 25-08-2011
18 MARTIN, R. P. op. cit., p. 884
19 MARIEM, op. cit., p. 149
20 Mateus 26.24,25
21 Bíblia de Estudo de Genebra, 1999, p. 1138
O Novo Dicionário da Bíblia, 1962, p. 884
22 Mateus 27.3-10; Atos 1.16-21,25; cf. Mateus 26.50